Duda Morteo

Uma conversa com Duda Morteo

A sensibilidade por trás da identidade de "Do Desapego ao Amor".

O ano de 2020 ficou marcado pelo álbum de lançamento da Juyè, “Do Desapego ao Amor” que é marcado por uma sensibilidade única por parte da MC, característica essa que transpõe apenas o limite sonoro e é contemplada com bastante cuidado na sua identidade visual. 

A responsável por esse trabalho é a designer, ilustradora, editora de vídeo, fotógrafa, diretora criativa e produtora Duda Morteo, nascida em Niterói (Rio de Janeiro), essa taurina indomável é a mente por trás de umas das capas mais bonitas do Rap nacional dos últimos tempos.

Duda Morteo (Arquivo Pessoal)

Seus trabalhos no meio musical são vários, desde a direção criativa e de arte do disco “Corar” da cantora Rebeca Sauwen até a produção do clipe “Cor do Meu Batom” da cantora Quel, em nosso papo Duda conta um pouco mais de sua carreira pra gente.

Confira a entrevista concedida ao Kalamidade:

Carreira no design e no universo das ilustrações

Kalamidade: Antes de entrar no papo sobre música, a gente quer saber um pouco sobre sua decisão de trabalhar com design, como surgiu o contato com essa profissão e como as ilustrações aparecem na sua vida também?

Bastidores da criação de “Do Desapego ao Amor” (Arquivo Pessoal)

Duda: Acho que não me conheço sem ter um lápis ou um pincel na mão. Desde que me entendo por gente, sempre fui incentivada a me expressar artisticamente. Minha mãe comprava metros e metros de cartolina, sempre tinha massinha, lápis de cor, lápis de cera e de lá começaram meus primeiros borrões, mas com sentido, ok? Tem uma pintura minha muito específica que chamei de “Posto de Gasolina”, consigo entender ela até hoje, mas logicamente, só eu entendo. Que criança pintaria um posto de gasolina? Pois é. Começar a faculdade de design veio também do meu fascínio por computadores. Amo arte digital e sempre fui apaixonada pelas possibilidades do Photoshop e do Illustrator. Eu era aquela adolescente que fazia montagens com fotos, que aprendia tudo com tutorial, então no meu terceiro ano do ensino médio, eu já sabia exatamente o que fazer e o único curso que juntava computadores e arte era o de Design. Nada mais perfeito. Minhas ilustrações foram mudando muito durante os anos, em 2014 comecei a tatuar e me especializei no Old School, então nessa época eu fazia ilustrações voltadas para esse estilo. Já em 2019, ano que eu estava completamente apaixonada pelo trabalho de Julio Le Parc, artista argentino abstrato e contemporâneo, criei o Abstração e Ilusão, coleção de ilustrações abstratas que possuo em parceria com a Galeria 9.

Início no mundo da música

K: Seu primeiro trabalho no mundo da música foi a direção criativa e de arte do disco “Corar” da Rebeca Sauwen, disco esse que foi indicado à primeira fase do Grammy Latino. Como foi o processo de criação desse trabalho e o recebimento da notícia dessa indicação logo em seu primeiro trabalho voltado ao universo musical? 

Projeto de Identidade Visual do disco “Corar” da Rebeca Sauwen.

D: Desenvolver as artes de “Corar” não foi uma tarefa nada difícil. Conheço a Rebeca desde a quinta série do colégio e desde então sempre fomos muito próximas e com isso, pude acompanhar todo o desenrolar da sua vida artística. Quando ela me chamou para participar do projeto “Corar”, eu pude mergulhar de vez nesse universo lindo de sons atmosféricos e tons pasteis.  Fizemos um photoshooting, que gerou a capa desse disco, fizemos o clipe de Corar e para finalizar, o disco físico. Eu estava num misto de felicidade e responsabilidade, porque ao mesmo tempo que era a minha amiga de anos, era também uma cantora incrível lançando o seu primeiro álbum solo. Rebeca enxerga cores nos sons, então foi muito fácil definirmos essa parte. O encarte do disco mostra bem isso, cada música tem a sua cor bem definida. Receber a notícia sobre o Grammy foi um choque, eu lembro de olhar a notificação no celular e ficar completamente sem reação, foi bem legal!

Parceria com a Mangolab

Bastidores da gravação de “Cor Do Meu Batom” da cantora Quel (Arquivo Pessoal)

K: Em 2019 você produziu a identidade visual do single “Cor Do Meu Batom” da cantora Quel em parceria com a Mangolab, ainda foi a responsável pela produção do clipe que usa muito bem cores mais quentes para sintetizar a obra da artista, como foi essa parceria?

D: O contato com a Quel foi um presente, eu ia muito na Mangolab por conta da Rebeca e acabei criando um laço ótimo com o Matheus Merenfeld, mago das mídias! Então quando a Quel se tornou artista de lá e ainda não tinha uma imagem formada, ele me chamou pra criar a identidade visual e fazer umas fotos dela. Nosso encontro bateu tanto que quando precisaram lançar o clipe, lá estava eu de prontidão, rs. Tenho um carinho enorme por esse trabalho e pela Quel!

Processo criativo para dentro do universo familiar de Juyè

K: O álbum “Do Desapego ao Amor” é um trabalho que carrega diversas camadas sentimentais da artista, seu trabalho não foge nem um pouco disso e é peça fundamental para o projeto como um todo. O trabalho foi tão bem cuidado que foi indicado aos finalistas da categoria “Capa do Ano” do prêmio da RAPTV de 2020. Como foi o processo criativo desse trabalho, desde o primeiro contato com a MC até a composição final?

Capa de “Do Desapego ao Amor” da Juyè
Bastidores da criação de “Do Desapego ao Amor” (Arquivo Pessoal)

D: Conheço a Juyè desde 2017 e sempre fui completamente admiradora do trabalho dela, temos uma relação bem próxima, então ela me mandava algumas guias pra eu ouvir (privilégios! rs) e eu ficava cada vez mais ansiosa para esse disco sair e até então eu não sabia de nada sobre ele, só que em alguma hora ele ia ficar pronto. Um dia ela me ligou e me fez esse convite completamente inusitado. Inusitado porque sinto um carinho profundo por ela, mas jamais pensei que trabalharíamos juntas. Eu sabia que não poderia entregar menos do que algo extremamente incrível.

Ela me ligou e depois que desligamos o telefone, eu pensei “ela e os filhos precisam ser a parte central dessa capa” e assim foi feito. A Juyè me pediu flores e brasilidade, nada mais. Na época, eu estava escutando muito o disco “Dois Amigos, um Século de Música” do Caetano e do Gil e a música “As camélias do quilombo do Leblon” não saía da minha cabeça, então fui procurar o significado espiritual das camélias e serviu como uma luva: as camélias representam grandeza de alma, nada mais perfeito para ilustrar a história de superação da Juyè. Tudo que eu queria com esse projeto era mostrar o amor dela pelos filhos, a foto de família que ela nunca pôde fazer, mas sem ser algo triste. Busquei a leveza também nos tons pastéis e na aquarela, todos os elementos dessa capa foram feitos à mão e apenas finalizados digitalmente.

K: Você também desenvolveu a arte para cada música do álbum, todas carregam uma identidade bem própria e chamam atenção por si só, trabalho bem elaborado com traços bem cuidados, como foi o processo de desenvolvimento do trabalho como um tudo?

D: Começamos com a capa de “Lago Luciana”, a Juyè me mandava a música e um áudio me explicando o que a letra queria dizer e conforme eu ia escutando, as imagens já iam se formando na minha cabeça. Foi um processo muito doido, acredito que foi algo muito luminoso que estava em mim nessa época. Eu terminava de ouvir, ia para o computador desenhar e em uns 20 minutos a capa já estava pronta e aprovada. Fizemos as 11 capas em uma semana praticamente.

Artes para faixas de “Do Desapego ao Amor”

Referências e sonhos 

K: Seu trabalho artístico junto da música é relativamente novo, mas vem mostrando que é algo que vem para ser duradouro. Partindo desse princípio com quais nomes da música você sonha em trabalhar, seja do Rap ou não?

D: Meu grande sonho sempre foi trabalhar com o Caetano, escuto desde a barriga da minha mãe. Um voo altíssimo, mas impossível jamais. Na cena do Rap, eu escolheria o Emicida e o Criolo, caras extremamente sensíveis e fortes que acredito que meu trabalho se mesclaria com os deles.

K: Antes da gente fazer nosso encerramento, gostaríamos que você nos falasse de capas do Rap nacional que você mais gosta, ou as que mais te chamam a atenção! 

D: Quando me perguntam sobre capas de Rap, não tenho como não falar de Gigantes do BK feita pelo Maxwell, um trabalho incrível e literalmente GIGANTE. Não foi à toa que ele ganhou uma exposição mostrando todo seu trabalho. Sou muitíssimo fã. Outra capa que sou apaixonada é “Marcelo D2 canta Bezerra da Silva”, lançado em 2010, onde ele recria por meio da foto de César Martín Tovar a pose antológica da capa de “Eu não sou Santo”, eu era adolescente quando lançou e lembro de ter ficado impactadíssima.

K: Grandes trabalhos musicais não são feitos apenas pelos MCs, uma equipe talentosa trabalhando nos bastidores enriquece a obra nos seus mínimos detalhes como no caso de Duda Morteo que com muito cuidado vem realizando lindos trabalhos no meio musical, obrigado pelo papo Duda <3

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Site – Duda Morteo.

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