Dr. Drumah e Cayo Carig se juntaram para o lançamento do álbum "Onde Nascem as Flores"
Dr. Drumah e Cayo Carig

Onde Nascem As Flores: o álbum colaborativo de Dr. Drumah e Cayo Carig

Produzido desde 2019, o projeto do multiartista Cayo Carig e do produtor Dr. Drumah, “Onde nascem as flores”, chegou carregado de conceito, explorando sonoridades do Jazz ao experimental, passeando do Boombap ao R&B.

Saudações família Kalamidade, depois de um tempo considerável longe dessa função de produzir conhecimento sobre a nossa amada cultura, estamos aqui de volta, tirando as teias de aranha, motivados por um lançamento que não podia passar batido pelo Kalamas. 

Estamos falando sobre o álbum colaborativo Onde Nascem as Flores, do nosso grande parceiro que já marcou presença por aqui com outros trabalhos, o produtor Dr. Drumah e do multiartista Cayo Carig, lançado em julho de 2025.

Para aqueles que ainda não tiveram o privilégio de ter contato com a música e o trabalho de Dr. Drumah, ele atua em projetos diversos como educador, colocando em prática uma importante essência da cultura Hip-Hop – e que está cada dia mais em falta – que é espalhar o conhecimento através da arte que amamos e produzimos.

Além dessa importante atuação, Drumah faz música há 25 anos, tanto como produtor musical quanto como baterista, sendo sócio fundador do grupo instrumental IFÁ, uma banda dedicada à paixão pelo afrobeat, com a percussão ocupando o lugar central das suas criações.

Fazendo parte de gravadoras e selos dos EUA, Alemanha e Inglaterra, e com 13 álbuns solos produzidos, dá pra entender um pouco o motivo pelo qual todo lançamento que tem o nome Dr. Drumah é um grande evento para nós, e exige do Kalamidade uma movimentação para espalhar a palavra de mais um belo trabalho desse importante artista.

Dessa vez, o lançamento do produtor de Salvador veio acompanhado de um nome que para mim era novo e acabou se tornando uma grande descoberta: Cayo Carig. O multiartista carioca define a si próprio como “uma pessoa que gosta de criar coisas”, explorando os conhecimentos que adquiriu ao longo da sua vida com a cultura Hip-Hop, em trabalhos que envolvem produções artísticas e musicais diversas.

Produção de batidas, criação de conceitos, designs, direção, roteiro, edição, ilustração, animação, pode escolher uma função, provavelmente o Cayo vai saber desenrolar. Criado em batalhas de rima e especializado em trabalhos audiovisuais, o multiartista já tem 20 anos de caminhada ao lado da música, e, na minha opinião, acho que já estava na hora desses trabalhos alcançarem um público maior.

Reunindo os conhecimentos, vivências e o amor pela cultura Hip-Hop desses dois grandes nomes, chegou em julho de 2025 o álbum colaborativo Onde Nascem as Flores. Com 8 faixas que transitam do Jazz ao experimental, passeando do Boombap ao R&B, este trabalho é apresentado como um álbum conceitual e denso, que conta uma história de autoconhecimento, fauna, flora e apocalipse.

Tivemos a honra de trocar algumas ideias com Cayo e Drumah, para poder nos aprofundar mais nos detalhes desse lançamento. Confiram abaixo nossa entrevista!

A feliz aproximação entre Cayo Carig e Dr. Drumah

Kalamidade: Salve salve, Cayo e Drumah. Primeiramente queria agradecer a disponibilidade de vocês de trocar essa ideia com o Kalamidade e também por essa abertura que vocês tiveram em trazer o trabalho para nós, para fazermos essa divulgação tão necessária e nos aprofundar mais nos detalhes que envolvem a construção desse novo álbum.

Pra começar esse papo eu queria falar justamente sobre a união de vocês nesse novo projeto que reúne dois artistas tão completos, que desbravam a música e o conhecimento artístico de formas muito amplas e diversas, misturando o puro suco do Rap carioca com as batidas, instrumentos e suingue de Salvador, em uma explosão de referências e repertório que enaltece muito a pesquisa de cada um de vocês.

Queria entender melhor sobre como se deu essa aproximação e colaboração entre vocês, que culminou na entrega desse lindo álbum.

Cayo Carig, multiartista que cantou e coproduziu o álbum Onde Nascem As Flores

Cayo: Salve, obrigado também por propagar esse trabalho que eu e o Dr. Drumah trabalhamos minuciosamente durante alguns anos, tenho um carinho grande por esse álbum pois ele carrega mensagens importantes.

A aproximação foi via internet, em 2019. O Slow Da BF, MC daqui do RJ, que fazia parte do Esquadrão Zona Norte, compartilhou a música Ouriços do meu álbum O Folclore Do Monstro Gigante e através do compartilhamento do Slow, o som chegou no Drumah. Daí ele me apresentou o trampo dele, eu dei o play em todos os álbuns e fiquei de cara com a discografia do irmão, fiquei energizado pra fazer o trampo acontecer.

Ele me chamou pra fazer um EP e já me mandou uns beats, na época, mal sabíamos que essa troca de beats ia resultar em um álbum. Daí já naquela mesma semana a inspiração foi certeira e já surgiram as tracks Visão Cósmica e Sozinho Na Floresta.

Cayo Carig e os aprendizados da cultura Hip-Hop

K: Agora eu queria desmembrar um pouco essa dupla e trazer mais da caminhada de cada um de vocês. Começando pelo Cayo, você que tem trabalhos em áreas diversas da música e do audiovisual, traz a atuação do artista independente como pauta e faz questão de reforçar como os seus aprendizados e conhecimentos devem agradecimentos à cultura Hip-Hop.

Nesse álbum, além das rimas e vozes muito bem trabalhadas e executadas ao longo de todo o projeto, você participou também da execução audiovisual do álbum, além de assinar diversas produções, além da mixagem e masterização das faixas.

Gostaria que você falasse mais sobre a sua atuação como um multiartista e como todos esses seus conhecimentos e habilidades artísticas reverberam neste álbum.

Cayo: Quando eu me envolvi com o Hip-Hop em 2005, ainda adolescente, eu havia passado por um período turbulento que me levou a largar a escola e parar os estudos. Foi aí que eu comecei a ir toda quinta-feira pra Lapa, rimar na batalha do conhecimento do MC Marechal. Acabou que foi como tinha de ser, pois a partir daí as coisas foram escalando.

O Mv Hemp (que inclusive abre o nosso álbum) e o Pedro Revoar (na epóca Dropê EJC) do Comando Selva me levaram pra cantar em vários lugares. Comecei a fazer beats incentivado pelo F2L (na época tínhamos um grupo com uns sons bem diferentes chamado 7F), e além de cantar comecei a fazer beat tapes e vender elas na rua.

Viajei sem dinheiro, só vendendo CD, e consequentemente eu acabei me envolvendo com audiovisual e design gráfico pra poder aprofundar os mundos que eu desenvolvia nas músicas.

Lancei um clipe de uma música na época usando o nome artístico Kiwi Qualquer, chamado Panda, em 2014, que me abriu diversas possibilidades de trabalho com vídeos. Daí consegui criar um sustento através da produção musical, audiovisual e design, por isso sou grato ao Hip-Hop, ele veio na hora certa e me botou no caminho certo, foi basicamente a minha faculdade.

Acho importante contar essa história, pois pode ajudar outras pessoas, muita gente acha que é só ficar famoso e fazer show, mas há muitas formas de se desenvolver através do Hip-Hop e criar um sustento. Por isso a pauta do artista independente/multiartista é forte no meu trabalho.

Eu nem penso em álbuns apenas como só músicas, penso neles como universos inteiros que reverberam tanto em imagens quanto em vídeos, e futuramente gostaria de expandir ainda mais essas imersões, pra além de imagens e vídeos.

Sobre a mixagem e masterização, esse foi um dos motivos da demora pro trabalho sair, só queria voltar a soltar músicas quando sentisse que as minhas masterizações estavam batendo como as tops do mercado.

Voltei com o compacto Espírito Dentro Da Máquina / Grandes Ideias ano passado, que já tinham a masterização ideal, mas foi esse álbum o principal pra ter esse aprendizado e estou bem satisfeito com o resultado, tão satisfeito que até relancei meu outro álbum remasterizado antes desse. (risos)

Agora sobre os audiovisuais, o que divulgamos até agora foi uma prévia do que vai vir com os clipes, é tudo produção independente.

Dr. Drumah e o processo de produção do álbum

Dr. Drumah, produtor do álbum Onde Nascem As Flores
Dr. Drumah

K: Agora passando a bola para o Drumah, queria primeiro me assumir um grande fã do seu trabalho, que eu conheci primeiro com o excelente Nu-Konduktor e a partir daí fui transportado para uma viagem transformadora pelo seu universo artístico, que é um dos mais ricos que eu já pude experimentar e que nos faz enxergar, através das suas criações, todo o potencial de pesquisa que a música e a cultura brasileira podem nos entregar.

Ao longo da sua trajetória musical, nós vemos as suas produções sempre explorando sonoridades diversas, como Jazz, Boombap, Disco, Funk, Soul, Dub, Reggae, destacando muito groove nos sons e encaixando instrumentos variados com uma habilidade e conhecimentos únicos. Nesse álbum, vemos isso acontecer mais uma vez.

Queria que você falasse em mais detalhes sobre como foi a sua pesquisa para esse projeto, que trouxe para nós um resultado que explora suas identidades e também apresenta novas facetas das suas produções.

Drumah: Esse álbum tem uma história peculiar (risos). Quando eu conheci o Cayo, eu estava produzindo o Nu-Konduktor que além de ser meu alter ego era algo mais puxado para os beats experimentais. Começamos a trocar ideia e logo saquei que esses beats combinavam perfeitamente com o flow dele e acabei levando o meu álbum para outro caminho e destinei essas batidas para esse nosso projeto.

Esse trabalho com o Cayo teve uma pesquisa muito especial, porque queríamos algo que transitasse entre o abstrato, psicodélico e o jazzy, então em seguida fui à procura dos samples, entre a minha coleção de vinil e o garimpo.

Como um bom digger sempre procuro explorar os sons mais obscuros para obter esse tipo de produção e sempre sair da zona de conforto. Nesse processo usei muita a MPC 1000 + a SP-404SX, junto com o FL Studio. Eu produzia os beats, enviava pro Cayo e ele fazia o filtro escolhendo o que tinha  a ver com a temática do disco ou não.

O resultado foi esse, um álbum com vários signos de referências que vai do Rock Psicodélico ao Jazz, para a música abstrata.

A produção colaborativa de Onde Nascem as Flores

K: Aproveitando que estamos falando sobre as batidas desse álbum, gostaria de saber de vocês dois como foi essa experiência colaborativa nas produções, combinando o catálogo riquíssimo do Drumah que vem sendo construído desde o ano 2000, com as referências e conhecimentos vastos do Cayo.

Como foi o trabalho da produção do álbum para resultar nessa entrega que transita do Jazz ao experimental, passeando do Boombap ao RnB, apresentando um universo onírico, que combina instrumentos e elementos diversos, ao longo de todas as faixas.

Cayo: Foi um ping pong, Drumah liberou muitos beats, eu escrevia, gravava a guia e mandava de volta. Às vezes, por eu também ser beatmaker e produtor musical, eu chegava com algumas propostas de arranjo e samples como em Rosas, Chuva e O Templo ou com um outro elemento como por exemplo a escaleta que toquei em Ache Onde Os Mundos Se Conectam, ouvindo as músicas durante o processo as ideias vinham.

Tive a ideia de chamar o Victor Lemos pra colocar uns saxofones nas faixas, primeiro porque eu sempre quis ter uma música com saxofone (risos), segundo porque achei que ia combinar com as vibes jazzy dos beats e acrescentar ao conceito do álbum, principalmente por instrumentos de sopro estarem associados ao fim do mundo (algo tipo “as trombetas do fim do mundo” da Bíblia).

Mas em resumo foi algo bem simples, uma parada que notei no Drumah desde o início é que ele ama a música assim como eu, então as faixas se desenvolveram basicamente sozinhas sem muita bateção de cabeça.

Ainda tiveram outras faixas que foram desenvolvidas mas acabaram não entrando no álbum.

Álbum conceitual na contramão da indústria

K: Agora eu gostaria de falar mais sobre o conceito do álbum que é um grande elemento apresentado e explorado com muita força em todas as faixas, construindo uma narrativa completa ao longo do projeto.

Em tempos nos quais vemos muitos trabalhos perdendo essa busca por um conceito, por trazer uma construção mais densa nos lançamentos musicais, esse álbum vai na contramão e apresenta uma série de referências em todos os elementos que constroem o álbum, desde as rimas, passando pelo audiovisual, até nas produções, que exploram a natureza, a criatividade, o fazer musical e o próprio futuro da humanidade.

Queria que vocês falassem mais sobre essa decisão criativa de apresentar um álbum conceitual e a forma como esse universo foi construído para resultar em uma entrega coesa e refrescante para o cenário musical e cultural muitas vezes engessado que acompanhamos.

Cayo Carig, multiartista que cantou e coproduziu o álbum Onde Nascem As Flores

Cayo: Acabou acontecendo naturalmente, assim como todas as músicas do álbum, percebemos que havia uma história ali, uma jornada, já os elementos da natureza traziam essa vibe de o álbum ser como uma “enciclopédia”, trazendo também muito conhecimento (o quinto elemento do Hip-Hop) nas entrelinhas.

Na parte das letras, é como se fosse um prosseguimento à história que comecei a contar no álbum O Folclore Do Monstro Gigante, lançado em 2018. Como os elementos da natureza estavam muito presentes no álbum, acabou traçando um paralelo do mundo interno com o mundo externo, sobre como tratamos o planeta e as consequências dos maus tratos à natureza.

Na minha visão, o mundo acaba no final da faixa O Templo e na faixa Flores (Outro) eu tenho a vibe de enxergar as plantas crescendo nas cidades abandonadas (risos). O despertador no final de Flores me remete que tudo foi um sonho, um aviso, e que ainda há tempo de mudar.

Mas acho importante deixar a história subjetiva, para assim, o ouvinte criar a própria narrativa durante as suas escutas.

Símbolos e mitologia: propagando conhecimentos através da caneta

Capa do álbum Onde Nascem as Flores
Capa do álbum Onde Nascem as Flores por Cayo Carig

K: Ainda falando sobre essa identidade conceitual do álbum, gostaria que o Cayo detalhasse mais sobre o trabalho de escrita e interpretação vocal que ele trouxe no álbum.

Nas suas rimas, você explorou muitas metáforas, referências da natureza, espiritualidade, mitologia e símbolos, apresentando todo seu repertório de leituras e conhecimentos,  enquanto oferece de volta tudo que o Hip-Hop te ofereceu.

Conta mais pra gente sobre o processo de escrita e de interpretação vocal que você trouxe para esse álbum, que muitas vezes faz parecer que seus versos são um fluxo de consciência, mas que convergem para uma linha narrativa coerente e bem construída durante todo o álbum.

Cayo: Na época que eu escrevi as letras eu tava lendo muitos livros de mitologia, de literatura oral brasileira, e lendo sobre as diversas religiões do mundo, tava estudando as diversas “bíblias” da humanidade como o “Tao Te Ching” do Taoismo, “Aquele Que O Abismo Viu: a Epopeia de Gilgamesh” dos sumérios, as histórias dos Orixás e também as mitologias brasileiras.

Tem diversas criaturas que não são tão conhecidas pelo público, principalmente por vivermos em um mundo muito eurocentrista. Por exemplo, o “Nibetad” que aparece na faixa Sozinho Na Floresta, que é um herói mítico identificado pelas Plêiades, descobri ele através do livro “Religião e Mitologia Kadiuéu”, do Darcy Ribeiro.

Outro exemplo é o “Gorjala”, que é um gigante da mitologia brasileira, utilizei esses símbolos para poder apresentar pra nós brasileiros as criaturas da nossa própria mitologia, visto que as mesmas são desconhecidas (por incrível que pareça).

Uma das minhas linhas favoritas do álbum é uma de Visão Cósmica, que diz: “Agora entendo bem o momento que Erê e Ibeji tapearam Iku”, que é uma referência a um conto Iorubá de quando os gêmeos Erê e Ibeji tapearam Iku, a morte, fazendo ela dançar ao som da música, ressaltando, na minha interpretação, o quanto a música salva.

Busquei trazer uma jornada nas letras das músicas e deixando aprendizados nas entrelinhas, escolhemos essa ordem das faixas para contarmos uma história. É um álbum feito pra se ouvir do início ao fim, como um livro.

Digo que busco oferecer de volta tudo o que o Hip-Hop me ofereceu, pois é como digo em Rosas, que é uma música sobre fazer música, na época que comecei a me envolver, só a música tinha me restado e por isso sou grato a ela.

É um álbum pra fazer você se sentir melhor com o lugar que você se encontra, independente de qual seja, e ao mesmo trazer alertas para fazermos movimentos para evitar o fim do mundo, e junto a isso, trazer conhecimentos nas entrelinhas.

Sobre as performances vocais, é aquilo, se é pra rimar, tem que ter flow, tem que ser musical, como o Rakim diz: “Gosto de pensar na minha voz como um instrumento solando em cima da batida”, dito isso, eu me atento a todas as pequenas melodias presentes ali no flow quando recito as rimas.

Hip-Hop é construção coletiva

K: Como a gente sabe que na cultura Hip-Hop nada se constrói sozinho, esse disco é uma prova viva dessa essência. Queria então que vocês comentassem sobre o trabalho conjunto que foi realizado com as diversas participações envolvidas nesse álbum, como as vozes de augras, Dora Viva, Lucas Felix, Nicole Rossi e MV Hemp, além de saxofones de Victor Lemos e scratches do DJ Simão Malungo.

Cayo: Com certeza, o Hip-Hop em si é um movimento coletivo. sobre as participações, foi tudo foi bem natural, vou explicar um a um: a augras é uma artista como eu, que trabalha por trás das cortinas tanto em músicas quanto em audiovisual, queria ter um som junto com ela, visto que somos artistas que atuam de forma parecida. Fui com meu microfone até a casa dela gravar a voz para acompanhar o refrão que eu tinha feito, e ela escreveu o que veio a ser o final da música ali na hora. 

Dora Viva já é parceira de longa data nas músicas, fazemos som juntos desde 2011. Como ela foi uma presença forte nas músicas do meu outro álbum, quis trazer ela de volta nesse álbum também. Artista super talentosa, que em algum momento vai lançar um álbum também. Desenvolvemos um refrão impactante como os que apresentamos no outro álbum e ela desenvolveu o verso dando atenção aos conceitos que eu queria reverberar.

O Lucas Felix, que era do grupo A.L.M.A. eu conheci no momento que ele ia lançar seu álbum solo de estreia, o qual eu fiz a capa, participei de uma das tracks do álbum dele e queria trazer ele pra um álbum meu também. É um dos meus MCs favoritos, com certeza ainda vai sair mais coisa nossa junto. Ele apresentou um verso bem melódico, que inclusive, foi a inspiração pra minha parte final da música.

A Nicole Rossi eu conheci fazendo um lyric video para o primeiro lançamento solo dela, eu curti tanto a voz e a vibe sonora que convidei ela participar de uma música. Acabou que essa música foi Rosas, o resultado final ficou incrível. Tenho um carinho grande pelo o que Rosas simboliza, afinal é uma música de amor pra música e a Nicole deixou isso ainda mais intenso com a sua participação.

As linhas melódicas foram certeiras, ela é professora de canto não é à toa. Destaco a hora que ficam só os vocais dela e depois entra o saxofone, um dos pontos altos do álbum na minha visão.

Sobre o MV Hemp, esse cara foi importante na minha caminhada de introdução ao Hip-Hop, abriu portas pra muita gente aqui no Rio de Janeiro começar a se desenvolver na rima. Eu comecei a rimar na batalha do conhecimento do MC Marechal, mas onde me desenvolvi mesmo como MC foi no Reciclando Pensamentos na Lapa, que era apresentado por ele e pelo Dropê EJC (hoje Pedro Revoar) do Comando Selva, isso lá em 2006/2007.

Quis trazer ele pra abrir o álbum principalmente por uma questão de respeito aos que abriram as portas pra mim. Com o passar dos anos ainda continuamos a nos esbarrar e trocar bastante sobre música e produção de beats, então a gravação da intro do álbum rolou em um desses encontros. 

Sobre o Victor Lemos, sem palavras, eu conhecia o trampo dele só pela internet, convoquei ele pra uma sessão de estúdio que foi lendária! O irmão surfou no instrumento, cheguei com a ideia de ele fazer a melodia do refrão de Rosas e ele acabou entregando muito além, com vários solos, foi difícil escolher qual track eu ia usar.

Já em Visão Cósmica foi onde a parada ficou realmente quente, fizemos muitos takes. “Faz agora em um tom mais alto, faz um tom mais grave, agora faz barulho mermo” (risos), queria que fosse uma introdução cósmica pra música que deu origem a todo o conceito do álbum. Sobre o DJ Simão Malungo, foi através do Drumah e ele pode explicar melhor.

Dr. Drumah, produtor do álbum Onde Nascem As Flores
Dr. Drumah

Drumah: O DJ Simão Malungo eu o conheci no período da pandemia nas lives na twitch e ele era o DJ do grupo Alquimistas de SP (São Bernardo do Campo). Comecei a colar nas lives dele e saquei que ele era bom com scratches e colagens e começamos a ter uma amizade e respeito um com o trabalho do outro, e aí resolvi fazer o convite e ele aceitou.

Escutando as músicas e a estrutura do álbum, senti a necessidade de ter scratches e colagens para manter vivo esse espírito do real Hip-Hop, porque hoje em dia está cada vez mais raro ver um disco onde o DJ tenha o protagonismo merecido, até porque eles são a essência do Rap.

Um álbum para evitar o fim do mundo

Logo Save The Planet, criada por Cayo Carig para o álbum Onde Nascem As Flores
Logo save the planet criada por Cayo Carig

K: Como já comentamos, o trabalho audiovisual é uma marca forte e presente em todo o desenvolvimento do álbum, contando com uma atuação que mostra a identidade do Cayo na arte da capa do álbum e do single Rosas, além de combinar com trabalhos de fotos, vídeos e animações, que contam também com a participação de Nilton Vianna e culminam na criação do logo save the planet.

Queria saber mais sobre esse trabalho visual que o álbum trouxe como destaque e como esses elementos foram pensados para conversar e elevar ainda mais todo o conceito da obra.

Cayo: Sobre o audiovisual do álbum, na campanha de lançamento mostramos um pouco do que vai vir com os clipes que ainda vão ser lançados. Como eu disse, penso em álbuns como universos inteiros. Já estou com alguns roteiros aqui que estão sendo executados. 

Criei e animei os personagens e o Nilton chegou junto pra animar o relógio e a minha amiga Amanda Suita também chegou junto modelando um dos personagem em 3D também, que ainda não deu as caras.

Sobre a capa do álbum, quis deixar com a energia de surpresa que eu sentia ao ver enciclopédias de Biologia quando eu era criança. A capa do single Rosas seguiu essa mesma lógica, só que tendo como base o poder do som e dos ciclos da vida e morte presentes na natureza.

Em breve chegam os clipes. Como eu e Drumah falamos muitas vezes durante o processo, “tudo no seu tempo”. Gosto de entregar obras que vão ser consumidas tanto hoje quanto daqui a 10 anos, com a mesma intensidade. Sei que o Drumah também, e isso também vale para os clipes.

K: Encaminhando para o final do nosso papo, ao longo do álbum são abordados os desafios e responsabilidades de duas grandes missões para o ouvinte: a missão de fazer música e a missão de salvar o planeta, e eu queria saber numa visão pessoal de vocês, como essas missões convergem entre si nas suas trajetórias artísticas e pessoais e como você sentiram o impacto de explorar essas reflexões na construção do álbum?

Cayo: Acho que fazer música é uma parada que quem se envolve com intensidade sabe, é impossível não fazer. Ao menos falando por mim, eu escrevo e canto porque isso me ajuda a enxergar os caminhos a serem seguidos na vida. Esse álbum e a jornada apresentada nele é bem sobre isso, ao mesmo tempo que fala sobre os movimentos para evitar o fim do mundo. 

Acho que nossas caminhadas convergiram neste álbum principalmente por amor à música. Sei que tanto eu quanto o Drumah estamos sempre em movimento, criando. Acabou que a vida proporcionou os nossos mundos se conectarem pra fazer essa obra acontecer. Sou grato pela oportunidade de colocar esse trabalho no mundo.

K: Pessoal, para fechar esse nosso papo, eu deixo aqui no final um espaço livre para vocês trazerem ideias, comentários, pensamentos e reflexões que não tenham sido exploradas durante essa nossa conversa e que vocês acham importante destacar. Além disso, quero agradecer mais uma vez a vocês pela atenção e disponibilidade que tiveram conosco nessa entrevista. Um grande abraço!

Cayo: Queria deixar a minha gratidão pelo Kalamidade reverberar este trabalho que eu e Drumah desenvolvemos com tanta atenção ao longo dos anos e agradecer também a possibilidade de contar algumas das histórias por trás do álbum.

É muito importante para o público ter contato com essas histórias, são muitos processos envolvidos na produção de um álbum e dificilmente isso chega até o público. Parabéns por manterem a chama da importância das histórias por trás da construção de um álbum viva.

Que esse álbum que desenvolvemos possa expandir a consciência de quem ouve, assim como os Raps que eu ouvia e libertaram minha mente quando menor fizeram comigo e me levaram a ser o que sou hoje. Busquei trazer isso nas rimas e na história desse álbum. Tamo junto!

Drumah: Gostaria de agradecer ao Kalamidade por sempre fortalecer! Vocês sempre estão apoiando a cena underground e independente do hype. Vida longa!!!

O álbum Onde Nascem as Flores está disponível nas principais plataformas de streaming.

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