Wander Scheeffer é um fotógrafo e videógrafo que tem trabalhado com artistas do Grime e Drill. Nascido no Pará há 25 anos e atualmente morador de Duque de Caxias, inspirando-se em filmes, Wander busca dar sua própria cara e criar uma identidade em todos os trabalhos.
Começo dos trampos e Brasil Grime Show
Wander conta que por volta de 2016, já interessado em fotografia, foi chamado por dois amigos para fotografar a festa que estavam produzindo. A partir da experiência de fotografar a Waves, começou a trabalhar em cada vez mais eventos e ganhar confiança no seu trabalho.
Um desses amigos, mais tarde, começaria o Brasil Grime Show e o chamaria para ajudar nos bastidores. Hoje, já parte oficial da equipe, Wander pode ser visto creditado na produção do making of dos vídeos do BGS. Lá foi onde ele conheceu os artistas com quem viria a trabalhar em gravações de clipes e fotografias, como SD9, d r o p e, e ANTCONSTANTINO.
Trabalho em videoclipes
Já atrás das câmeras para filmar, Wander pode trabalhar com uma de suas paixões, que era ser Diretor de Fotografia. Ele conta que teve trabalhos antes de começar com artistas de Grime, mas faltava confiança, e só em 2020 tomou a decisão de que precisava começar a focar de verdade nos clipes. Mesmo com a pandemia, pôs o trabalho para frente e assim fez o clipe de Contagem, do ANTCONSTANTINO, lançado no canal do Brasil Grime Show.
Nesse clipe, Wander trabalhou como diretor, câmera e editor e é possível ver algumas marcas de seu trabalho que são constantes, principalmente na paleta de cores e no trabalho de câmera. Ele gosta de closes e levar o público para perto dos artistas, com muito senso de imersão.
A partir daí, surgiram outros trabalhos, com destaque para suas colaborações com o diretor Eduardo Santana para os clipes de “B.O | Números” e “40º.40” do artista SD9 e para “Doutrinado” de D r o p e.
Inspirações e influências
Os clipes nos quais Wander trabalha são bastante cinematográficos e ele não deixa escondido a influência que o cinema tem em suas escolhas de câmera e cinematografia. Filmes como “Amores Expressos (1994)”, do diretor honconguês Wong Kar-Wai, e “Climax (2018)” filme de Gaspar Noé, são exemplos. Essas obras têm um trabalho de câmera similares aos utilizados por Wander, com proximidade, sem estabilizadores e iluminação sempre com uma cor dominante.
Talvez o maior exemplo de suas influências possa ser encontrado no clipe de “40º.40” de SD9, dirigido por Wander:
40º.40 era uma ideia que eu já tinha a muito tempo atrás quando eu ouvi o primeiro EP do SD, o AM:PM, eu ouvi uma música, acho que a primeira do EP e por algum motivo me veio as cenas de La Heine, o filme francês. E me veio essa ideia de criar esse clipe baseado no La Heine, mas acabou não rolando e a gente jogou a ideia mais pra frente e acabou se tornando o clipe de 40º.40, a faixa principal do álbum.
O filme La Haine tem muitas das características que viriam a aparecer em clipes não apenas do Grime brasileiro, mas muito mais na cena do Reino Unido. É a violência mostrada como o único ambiente conhecido, sempre com ritmo frenético. O espectador se sente vendo muito mais de perto os acontecimentos. Em “B.O | Números” é criada a atmosfera de expectativa, os momentos dentro do carro, faz com que quem assiste se sinta como parte dos assaltos que o grupo realiza.
Ainda nessas influências, Wander fala de um dos clipes mais recentes em que trabalhou, “Doutrinado”, música de D r o p e. Esse clipe é em primeira pessoa, ideia do seu colaborador Eduardo Santana. Traz muitas ideias exploradas no cinema brasileiro, como em “Cidade de Deus”, de imergir o público nas realidades narradas na música, de alguém que foi “doutrinado pra matar, não foi doutrinado pra sentir dor”.
Nesse clipe a imersão fica ainda mais evidente e quem assiste é transportado para dentro daquele mundo. Wander conta que trabalhou usando apenas sua DSLR e planejava as tomadas pensando sempre no tema principal da música. A ideia de Wander não é ter apenas um clipe com o MC cantando em frente a uma câmera, mas contar uma história visual que complemente a história que vem com as músicas.
DJ sets e colaboração com ANTCONSTANTINO
Mas além dos clipes, Wander também fez trabalhos com o seu amigo e colaborador, ANTCONSTANTINO, os DJs sets chamados de A Prova de Nada. O primeiro deles foi gravado em uma cachoeira em Guapimirim, RJ, e o segundo foi gravado numa passarela bem no meio de Duque de Caxias, RJ, cidade onde os dois moram.
Ele teve essa vontade de fazer DJ Set e eu falei “cara, vamos fazer. Eu gosto de filmar, gosto de querer produzir algo com uma estética diferente e vamos fazer com um visual diferente né. Tanto ele quanto eu somos de Caxias e a gente falou “é, vamos fazer em Caxias”.
Esse set na passarela em Caxias, apesar da câmera estática, também tem o mesmo traço dos outros trabalhos de Wander. É impossível assistir sem sentir a vida que existe no lugar e ser transportado para lá, com as pessoas passando de um lado para o outro, lá no fundo o trânsito andando devagar e o pôr-do-sol batendo nos prédios.
Futuro do Grime e Drill no Brasil
Muito mais do que os planos para gravações de clipes e retratos, Wander enxerga no Grime e Drill um potencial real de se tornarem gêneros ainda mais populares e dominantes no Brasil, como aconteceu com o trap.
“Eu acho que eles iam estourar bem mais em 2020, mas acho que quando veio a questão da pandemia, acabou não tendo festa, acabou não tendo evento e ficou meio blocada isso”.
Propulsionado pelo próprio canal Brasil Grime Show, mas, também, pelo incrível carisma dos MCs que incorporam esses gêneros, é completamente possível ver Grime e Drill tomando conta do cenário musical brasileiro. Por mais underground que os dois sejam.
É improvável, porém, imaginar esses gêneros não atrelados a um bom trabalho visual, que alinhe com todo o clima que as músicas acabam gerando. Ainda temos muito o que ver através das lentes de Wander.