O olhar e as lentes de Lari Zaidan

Fotógrafa e Diretora, Lari Zaidan eterniza momentos e retrata grandes nomes do Hip-Hop

Salve família Kalamidade, Gustavo aqui em mais um Pega a Visão! Hoje vamos trazer a visão, as lentes, as ideias e os corres da Diretora, Fotógrafa e Diretora de Fotografia Lari Zaidan.

Hodari por Lari Zaidan

Com uma trajetória no Fotojornalismo iniciada na VICE Brasil, em 2016, Lari documentou principalmente a cultura jovem e o universo LGBTQIA+, cobriu bailes Funk, além de fotografar e dirigir documentários como a websérie “Transe”.

Em 2019 Lari fez seu primeiro trabalho como Diretora de Fotografia no filme sobre a expectativa de vida de pessoas trans no Brasil, “35”. No mesmo ano, foi responsável por realizar a Direção de Fotografia e Cor do clipe “Carta pra Amy”, de Black Alien. Em 2020, o clipe conquistou o segundo lugar na categoria Videoclipe do Ano do Prêmio Genius Brasil.

Trabalhando com nomes como Rincon Sapiência, Sain, Linn da Quebrada, Mano Brown, Rico Dalasam, Don L, Liniker e muitos outros, Lari Zaidan compartilhou com a gente suas visões sobre os seus trabalhos audiovisuais junto à cultura Hip-Hop, e todo o universo captado pelas suas lentes.

Na voz, Lari Zaidan!

Don L por Lari Zaidan

Cultura jovem e Hip-Hop

Kalamidade: Salve Lari, pra começar esse papo eu queria falar sobre a sua trajetória e contato com o Hip-Hop. Você começou seu corre com a fotografia na VICE, em 2016, documentando muito a cultura jovem, principalmente através de bailes Funk. O seu contato com a cultura Hip-Hop surgiu também dessa sua atuação com o Funk? Conta pra gente, em que ponto dessa caminhada começou o seu contato maior com a cultura Hip-Hop?

Lari Zaidan: Na verdade acho que eu sempre tive muito interesse em entender como a cultura molda a vida do ser humano. E a música tem um papel gigante nisso, né. Eu comecei a cobrir para a VICE os fluxos ilegais na periferia de São Paulo por causa disso, queria entender e retratar a presença e influência do funk nesses bairros. Já o Rap, eu acho que particularmente vem de uma motivação mais pessoal. Desde muito nova eu escutava Rap, eu admirava artistas, eu ia na batalha da Santa Cruz, na Hole. Então quando comecei a fotografar pra VICE, naturalmente eu me interessei em abrir uma porta que me possibilitasse retratar os artistas que eu admirava. E ao mesmo tempo fui convivendo com uma galera como o Rico, Ogi, Don L, Lay, o que me permitiu fotografar com um pouco mais de intimidade, sem que fosse necessariamente um trabalho com prazo a ser entregue. Várias vezes eu encontrava um jeito de conciliar minha vontade pessoal de fotografar os artistas com o meu trabalho, então sempre que tinha oportunidade de entrar em camarins e bastidores eu ia e pensava num jeito massa de retratar aquele momento.

K: Além dos seus trabalhos com o Funk e o Hip-Hop, outra forma que você encontrou de se conectar com a identidade e o movimento da cultura jovem é através dos seus trampos junto ao universo LGBTQIA+, que foram e continuam sendo um grande foco dos seus trabalhos. Como o seu contato, e a sua vivência nesse universo, impactaram na sua forma de retratar através de fotos e vídeos, as diferentes identidades e histórias que você conheceu ao longo da sua trajetória?

L: Pra mim tem uma questão bem importante e pessoal nisso, pois a minha busca por retratar o universo LGBTQIA+ nasceu depois que meu irmão se assumiu gay com 17 anos.  A partir de então, acho que a minha percepção de mundo mudou muito. Eu vi um menino tímido e retraído se tornar uma pessoa muito mais confiante e aberta pro mundo. Ao mesmo tempo, vi muita gente que se dizia “amigo” dele se afastar ou fazer comentários preconceituosos. Eu quis entrar junto com ele nessa jornada de descobrimento, ele me ajudou muito nas pesquisas e a conhecer pessoas que me guiaram com muito carinho nesse universo. E na minha cabeça sempre esteve a certeza de eu que queria retratar as pessoas com dignidade, engrandecendo o que elas têm para dar ao mundo.

A arte pra mim passeia por esse lugar, sabe. Um lugar de entender o sentido da vida e por que vale a pena estar aqui. Não só porque vale a pena eu estar aqui, mas o motivo que cada um carrega em sua trajetória. Isso se tornou cada vez mais potente dentro de mim a partir da minha relação com meu irmão.

Rico Dalasam por Lari Zaidan

A arte da Direção

K: Inclusive, a sua primeira atuação como Diretora de Fotografia foi com o curta “35 – Forever Young”, que fala sobre a expectativa de vida de pessoas trans no Brasil, embalado por uma linda interpretação da Liniker da clássica canção da banda Alphaville. Conta pra gente como foi essa primeira atuação nesse novo posto, e quais adaptações e lições você teve que aprender ao longo dos seus trabalhos para evoluir como uma Diretora de Fotografia?

L: Até fazer esse primeiro trabalho como Diretora de Fotografia, eu não tinha quase nenhum contato com a parte técnica de direção de foto. Então eu fiquei muito ansiosa pra participar do projeto. Tive bastante gente que me ajudou nas semanas anteriores à filmagem e um amigo que esteve inclusive no set para dar uma enorme força em tudo. Na época eu não manjava os nomes técnicos das luzes e dos equipamentos, então eu tinha que pedir as coisas de uma forma bem mais simples. O que eu fiz, e que faço até hoje, que me ajudou muito foi desenhar cena a cena de enquadramento e composição para as diárias de filmagem. A visita de locação também me ajudou imensamente, pois como antes eu trabalhava na VICE de uma forma mais guerrilha, nunca tinha muito tempo para organizar as filmagens. O Del [diretor desse filme] foi um cara que me deu um super voto de confiança, ele acreditou no meu trabalho 100% numa época em que eu realmente estava muito crua no rolê do audiovisual.

Daí que eu aprendi que não existe a possibilidade de ficar um dia sem estudar Fotografia e Direção de Fotografia. É muita coisa para assimilar, muitas perspectivas. Aprendi também que não se trabalha sozinha na direção de foto. Ao contrário do still, num set de filmagem é impossível executar algo solo, a equipe é fundamental nesse processo.

K: E em 2020, com um trabalho muito especial de Direção de Fotografia e Cores, você colocou seu nome no clipe de “Carta pra Amy”, do Black Alien. Fala pra gente um pouco sobre como rolou a oportunidade e todo o desenvolvimento desse trabalho, que conquistou recentemente o 2º lugar na categoria “Videoclipe do Ano” no Prêmio Genius Brasil 2020.

L: Olha como as coisas são. No começo da pandemia eu estava trocando uma ideia com a Marina, esposa do Gustavo, sobre dirigir algum clipe dele. Desde muito tempo ele esteve na minha lista imaginária de artistas que eu mais queria fotografar. Como as coisas ainda estavam super nebulosas e incertas na época, acabou não rolando. Uns meses depois, a diretora Gabi Jacob me mandou uma mensagem dizendo que tava roteirizando “Carta pra Amy” e me convidou para assinar a Direção de Fotografia do clipe. Ela me contou um pouco sobre o trabalho e juntas fomos trocando referências para construir a fotografia do filme. A gente teve duas diárias de filmagem, uma na praia só com o André Ramiro e uma em São Paulo com o ator e com Gustavo. Foi legal ter tido a primeira diária com André porque ficamos mais próximos, o que ajudou a ter um pouco mais de intimidade na segunda diária. Na diária em que o Gustavo estava presente também foi bem intenso. Ele foi um cara super gentil, educado e carinhoso com toda a equipe, me senti honrada de poder ter participado desse trabalho. Outra coisa massa que rolou foi que fiz o Color Grading do clipe. Isso tem sido uma experiência surpreendentemente positiva porque sinto que consigo me aproximar cada vez mais da minha fotografia still.

Eternizando ídolos

K: Além de ser responsável por produzir trampos com a sua cara que alcançaram projeção nacional, como você sente e trabalha essa relação de uma possível fã atuando ao lado de nomes como Black Alien, Mano Brown, Linn da Quebrada, Liniker, Rico Dalasam, Rincon Sapiência, equilibrando com o papel e a postura profissional de uma Diretora ou Fotógrafa num local de trabalho. Como você sente essa questão no seu corre diário?

Mano Brown por Lari Zaidan

L: Quando vou trabalhar com algum artista que admiro eu normalmente vou com uma cabeça super focada e acabo tendo que pensar em mil coisas para meu trabalho ficar do jeito que imagino. É importante que a pessoa que se sinta à vontade então na hora eu tento de verdade pensar o mínimo possível em outras coisas. Sem contar que eu sempre pensei que a memória mais preciosa que eu poderia ter de artistas que admiro é por meio da fotografia. Então eu me sinto muito honrada de ter a oportunidade de retratar essas pessoas.

K: Lari, o retrato é um forte elemento do seu trabalho na Fotografia, e você já teve a oportunidade de retratar através do seu olhar figuras como Elza Soares, Criolo, Gaspar Noé, Lourenço Mutarelli, e muitos outros. Eu queria saber o que te instiga na linguagem dos retratos, e qual o valor pessoal de ter grandes pessoas, sejam elas celebridades ou anônimas, retratadas pelo seu olhar?

L: Eu acho que é uma troca de intimidade muito grande, o retrato. Eu me sinto honrada quando uma pessoa aceita ser retratada por mim, isso significa que por alguns segundos ou minutos o universo se resume pra mim a apenas essa conexão.

E sinto também que é quase um ato de desespero meu em tentar eternizar o máximo de momentos com essas pessoas. Essas fotografias me dão um acesso de memória que posso revisitar pra sempre. É como se fossem “checkpoints” da vida.

Elza Soares por Lari Zaidan

Sobre referências e futuro

K: Por aqui a gente sempre gosta de saber sobre os trabalhos que estão influenciando os nossos entrevistados. Então conta pra gente, quais trabalhos e nomes estão te inspirando e influenciando atualmente?

L: O que mais me inspira com toda certeza são meus amigos e as nossas vivências. Eu vivo rodeada de fotógrafos e artistas que admiro muito: Ênio Cesar, Rafael Mattar, Vitor Cohen, etc. São as pessoas que estão ao meu redor que me dão a maior parte das referências pros meus trabalhos, desde conversas, até noites mal dormidas andando pelo centro da cidade. Isso é uma das coisas que mais tenho sentido falta durante a pandemia, pois era um combustível muito bom para pensar nos meus trabalhos. A literatura tem me inspirado muito ultimamente. Tenho lido bastante ficção científica do Isaac Asimov, histórias distópicas. O livro “Esculpir o Tempo” do Tarkovsky também me inspira muito a pensar no cinema e na arte.

K: Pra fechar esse papo Lari, quais próximos projetos a gente já pode ficar na espera pra ver o seu nome nos créditos?

L: Eu acabei de dirigir e fazer a direção de fotografia de um promo/poema do Rico Dalasam que deve sair no começo de março. É um trabalho que eu gosto muito e estou feliz de ter feito parte. E para esse ano eu tenho planos de fazer um trabalho documental de fotografia e filmar um curta, vamos ver se dá certo.

Valeu pela troca de ideias Lari! Para nós do Kalamidade é muito importante garantir esse espaço de destaque para profissionais tão essenciais para a cultura como aqueles que estão na contenção audiovisual, sempre por trás das lentes e câmeras.

E pra você ficar por dentro e atualizado dos trampos e corres da Lari Zaidan, siga ela nas redes sociais e acompanhe o site que reúne todos os trabalhos de Fotografia e Direção da Lari. Só tem pérola!

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