Salve salve leitores do Kalamidade, tudo bem com vocês? Eu espero que sim! Aqui quem vos fala é o .JPEG, MC, artista gráfico e entusiasta na produção dos beats e dos graffitis. Faço aqui a minha estreia no portal falando de uma das coisas que eu mais amo da cultura, o graffiti.
Quem anda pelas ruas de Belo Horizonte certamente já deu de encontro com algum desses palhaços pelas ruas e é meio que impossível não se impressionar quando você vê essas artes dando cor ao cinza da capital. Vou apresentar a vocês uma pessoa que me orgulho muito de ter conhecido justamente caminhar por Beagá.
Sem mais delongas hoje o Kalamidade entrevista Nilo César Sampaio de Lima, mais conhecido como Nilo Zack, grafiteiro natural de Belo Horizonte, Minas Gerais, formado em Cinema de Animação e Artes Digitais pela UFMG, que aproximadamente há 12 anos se dedica às artes visuais.
Kalamidade: Para começar, agradeço a você por ter aceitado o nosso pedido pra esse bate papo e já te faço o convite para se apresentar ao nosso público que ainda não te conhece tão bem quanto nós aqui da capital mineira.
Nilo Zack: Sou Nilo Zack, artista visual, 34 anos, nascido e criado no aglomerado do Taquaril, extremo leste de Belo Horizonte. Formado em Cinema de Animação e Artes Digitais pela UFMG e grafiteiro desde 2004.
K: Nilo, pelo que pesquisei você é graduado em Artes Digitais pela UFMG, isso foi antes ou depois de você se aproximar da cultura Hip-Hop e se dedicar ao graffiti? Como foi pra você essa migração de experiência da arte de forma digital para as ruas movimentadas de Belo Horizonte?
NZ: Sempre gostei muito de desenhos, sonhava desde criança em fazer desenhos animados. Com o tempo essa vontade de infância, foi sendo soterrada, principalmente pelas condições socioeconômicas da minha família e da comunidade onde fui criado. No início da adolescência, conheci a pixação, e aquilo é o mais próximo de arte que eu tinha acesso. Depois veio o graffiti, como um “salvador” na minha vida. As pesquisas sobre graffiti, me ensinaram a ter gosto de ler e estudar e os diversos estilos dessa arte marginalizada me levaram a tentar entender o que realmente é arte.
Entrando na primeira oficina como aluno em 2004, depois em 2007 como professor no mesmo projeto social, vi a necessidade de buscar mais conhecimentos e acabei desenterrando meu sonho e fui me inscrever para o vestibular para o curso que acreditava ser o ideal. Assim, estudei 5 anos em duas universidades, UFMG e UBI (Portugal), tentando absorver o máximo de conhecimento não apenas em animação, mas também cinema, fotografia, composição visual, pintura e programação de computadores.
K: Em outras entrevistas, você disse que seu pai era pintor e letrista e que chegou até a trabalhar com ele, como é para o seu pai ver hoje o artista importante que você se tornou? Você se lembra da primeira vez que ele viu uma arte sua na rua? Como foi?
NZ: Depois que resolvi seguir sendo artista, acabei me distanciando do meu pai que foi uma das minhas maiores influências. Hoje acredito que o contato que ele tem com o que eu faço, vem das redes sociais. Algumas vezes recebo algumas mensagens dele elogiando algumas ações específicas, porém acredito que ele vê o que eu faço como uma profissão comum, como um letrista que ele foi ou mesmo como um padeiro, acho bom ser assim, sem mistificação e estrelismo.
K: Você é morador do bairro Taquaril, zona leste de Belo Horizonte e é muito engajado com os problemas sociais que o bairro enfrenta, creio que tenha sido o motivo da criação do projeto “Taquaril Solidário”. Como foi o start dessa motivação em contribuir de mais uma forma com a sua proximidade? O projeto tem dado bons frutos?
NZ: Sou fruto de mãe negra, de projetos sociais, acredito que está no meu cerne enxergar os outros como meus semelhantes. Porém, meu avô, Damião Rosa de Lima é minha primeira inspiração para as ações sociais e humanitárias que faço nesse momento de pandemia. Com uma mãe envolvida em ações sociais e um avô envolvido em ações humanitárias, fica fácil se influenciar. Mas também sei que a escolha é minha e ajudar é a minha escolha, sendo pela distribuição de alimentos pelo Taquaril Solidário ou pela difusão de informações gratuitas pelo Dicas de Graffiti no YouTube.
NZ: O Taquaril Solidário surgiu em 23 de março de 2020 e até a presente data já distribuiu mais de 2.500 cestas básicas e kits de higiene pessoal. Além de sanar algumas demandas pontuais de algumas famílias, como recursos para remédios, fraldas, gás de cozinha e outros.
K: Você também falou em algumas outras entrevistas que pela falta de uma oficina de graffiti no bairro, acabou resultando na criação de uma oficina de vocês. Tempos depois você iniciou o canal no YouTube “Graff Films”, com o quadro “Dicas de Graffiti” onde você também ensinava algumas técnicas e uns macetes pra grafitar. Esse sentimento da necessidade de compartilhar o que você sabe com as pessoas te rendeu algum pupilo que se aproximou da arte por meio dessas suas iniciativas?
NZ: Dentre os diversos frutos gerados pelas ações sociais, há alguns que sinto um carinho especial, jovens atendidos que mudaram de percurso e se tornaram, professores, policiais, pequenos empresários, até o jovem Lucas Alpha que hoje ensina graffiti no Fica Vivo, onde eu o tive como aluno.
K: Anos atrás você fez a exposição “Sentimentos de um Niilista” na Galeria do Museu Mineiro. Como foi pra você essa experiência de levar o que antes era admirado apenas pelas ruas da cidade, à uma exposição em um Museu? O que passou na sua cabeça ao receber o convite? Sentiu alguma diferença ao acesso do público à sua arte ali naquele local?
NZ: Receber um convite para expor, acredito ser bem gratificante para qualquer artista, independente do seu segmento, e comigo não foi diferente. Naquela exposição em específico, pude mostrar trabalhos inéditos, que dialogavam com o público de forma direta pelo ambiente que se encontram. Foi uma honra, expor no Museu Mineiro e saber que hoje há uma obra de minha autoria em seu acervo, isso garante que a história do graffiti será preservada e contada para as gerações futuras.
K: Há alguma arte que você fez que tem como sua preferida? Se sim, qual?
NZ: Não tenho uma pintura de preferência, cada uma delas é um apanhado de instantes de vida e trabalho, vejo o que fiz e fico feliz por ter feito, mas não tenho uma que goste mais.
K: Tem algum lugar em BH, ou no Brasil, que você queira deixar sua arte?
NZ: Gostaria de expor no CCBB [Centro Cultural Banco do Brasil] e também pintar um prédio, seria interessante, novas experiências.
K: Como você vê o graffiti mineiro/brasileiro daqui há 10 anos? Há pessoas que você já vê potencial de seguir construindo novos caminhos para a arte de rua?
NZ: Daqui a 10 anos haverá muito mais arte nas ruas, diversos estilos e linguagens. Tem muita gente querendo se expressar, muitos oprimidos que não alcançaram um patamar pra poder se expressar, mas logo isso acontecerá e quem ganhará com isso somos nós, a sociedade, que será mais justa, equilibrada e colorida.
Nós da equipe Kalamidade gostaríamos de agradecer a disponibilidade de Nilo Zack! Você pode saber um pouco mais sobre os trabalhos do Nilo pelo Instagram @nilozack onde o artista publica o seu cotidiano de maneira mais pessoal e direta.