B No Beat / Foto: @red.wl

B No Beat: sobre Boom Bap, samples e a voz através dos beats

O Perfil de hoje traz a beatmaker B No Beat, que resgata importantes elementos da cultura em suas produções já estabelecidas no Boom Bap, expressando a sua voz através dos beats.

Hoje retornamos com a nossa editoria Perfil, apresentando o trabalho, a trajetória e as visões de grandes artistas da cultura Hip-Hop, que engrandecem o movimento através dos seus trabalhos e merecem um destaque maior pela importância das suas atuações.

B No Beat / Foto: Bianca Monteiro

No Perfil de hoje, convidamos uma pessoa que tem construído um caminho cheio de identidade no Rap nacional através das suas produções já estabelecidas no Boom Bap, através do qual ela resgata importantes elementos da cultura como os samples, e atualiza um gênero tradicional e essencial, expressando a sua voz através dos beats.

Diretamente de Uberlândia (MG), o Perfil de hoje é com Brenda Souza, mais conhecida como a beatmaker B No Beat! Com uma trajetória recente na produção, B já conta com três beat tapes lançadas: “Capítulo 1. Contei nos BPM” (2020), “Beats & Samples” (2020) e “O Que Não Valia” (2021), além de diversos singles e participações em importantes projetos de outros artistas.

Apesar da caminhada recente, B traz na sua atuação como beatmaker uma identidade artística forte e muito bem definida, apresentando uma relação única com o Boom Bap, que já garantiu a ela participações em trabalhos de grandes referências do Rap nacional. Para saber mais sobre este, e outros projetos da B No Beat, confere a entrevista que fizemos com essa grande beatmaker.

O Beat Fala

Kalamidade: Salve B! Primeiramente valeu demais por aceitar esse convite. Pra gente é uma satisfação enorme poder trocar essa ideia com você. Eu queria começar o nosso papo aprofundando em uma frase característica sua: “o beat fala”. A cada dia temos visto crescer o reconhecimento por beatmakers e a valorização da produção musical no Rap nacional. Você encontrou esse valor na prática e descobriu aí a sua identidade artística. Fala um pouco pra gente sobre essa possibilidade de falar através dos beats que você encontrou com as suas produções.

B No Beat: Salve família Kalamidade, satisfação poder estar em um espaço que tem fortalecido tanto os artistas independentes. Vamos lá, “o Beat Fala” é o motivo pelo qual faço beats, porque todo aquele conjunto de bateria, samples, melodias, graves, etc, falam comigo e com qualquer um que se permitir sentir. É muito forte porque o beat te faz um convite para um olhar introspectivo onde você conversa e desperta coisas no seu interior. É louco pensar que eu espero que as pessoas entendam uma música sem letra, mas isso é um convite pra ser livre e sentir o que você quiser. E hoje esse consumo de música instrumental dentro do Rap também tem ganhado força, óbvio ainda é um caminho sendo construído e eu tenho consciência que escolhi o caminho menos convencional, foram quase dois anos soltando apenas instrumentais até me sentir pronta pra fazer conexões com MCs e acho que foi importante pra mim não ficar presa na possibilidade de só fazer música caso alguém fosse rimar. É isso, o beat sempre vai falar pra mim.

https://www.youtube.com/watch?v=JwUsLt_BNWk

Mundo Boom Bap

K: E no desenvolvimento das suas produções, você encontrou no Boom Bap o seu lugar de destaque. Nessa sonoridade clássica, que reúne tanto da essência e das tradições da cultura Hip-Hop, você chegou atualizando estéticas, valorizando elementos clássicos e desenvolvendo produções cheias de identidade. Queria que você compartilhasse com a gente como as suas produções assumiram esse protagonismo no Boom Bap, e como essa sonoridade dialoga com a sua identidade como beatmaker.

B: Boom Bap tomou meu ouvido desde que me percebi com vontade de produzir, é um estilo que me fascina pela densidade, Boom Bap pra mim é o mundo sabe? Como ele é, difícil, cheio de amores e dores, cheio de coisas que não entendemos, mas assim como no mundo, tudo caminha, a gente segue tentando colocar pra fora formas de melhorar, de se entender, de se expressar, de contribuir.  É isso, Boom Bap me faz entender a vida ou pelo menos facilita ela pra mim, e acho que todos os meus questionamentos internos, todos esses sentimentos e observações me fazem querer passar isso para as produções, só comecei a produzir porque tinha uma necessidade enorme de colocar pra fora o que sentia e essa foi a forma que achei e acredito que isso fica claro na forma que eu produzo. Eu me entrego ao sentimento do momento. Amo os outros estilos, e não tô aqui pra levantar bandeiras, inclusive produzo, mas tá ligado? É o meu primeiro amor, hahaha.

K: Um dos elementos clássicos da produção que marcam presença nos seus trabalhos com frequência são os samples, dos quais você já é uma colecionadora. Nas suas produções você busca trabalhar esse papel do sample como uma arte de ligação entre gerações, e uma forma de trazer fôlego e atualização para o Boom Bap?

B: Eu acho importante respeitar a história, independente do que produzimos, houve um caminho trilhado antes de nós e o Boom Bap tem o seu peso na história. Me fascina pensar que uma música vira outra coisa, de uma forma completamente diferente ou como uma releitura mesmo de samples clássicos, acho que é natural que as coisas evoluam, querer me manter no Boom Bap não me impede de colocar as minhas características, a arte é livre e nos dá essa abertura. Pra mim é um desafio pessoal conseguir recortar um sample de um jeito que faça ele causar algo em mim, eu costumo brincar que sei que o sample é bom quando me faz ter vontade de chorar, e acho que é isso sabe? A forma que eu encontrei de atingir o que eu queria dentro de um beat.

Sobre se manter e somar

K: Enquanto uma artista independente, e uma produtora fortemente presente na cena underground do Rap nacional, você faz parte de um movimento muito colaborativo e com uma veia de parceria grande entre artistas, MCs e produtores, algo que remete à essência do Hip-Hop mas não é muito encontrado no mainstream que tenta reproduzir um ambiente de competição e disputa frequentemente. Como você sente essa relação entre os artistas do meio underground e a sua presença nessa cena.

B: Complexo essa pergunta, quem vive de arte precisa se manter de alguma forma, e o capital do dinheiro gira pra quem vai se “destacar” mais, então não julgo quem acaba caindo nessa pilha. Mas não é o que eu busco pra mim, acredito que sozinho a gente até chega em algum lugar mas se manter lá sozinho não é fácil, na minha cabeça ainda tenho a ideia que se geral se ajudar, geral chega longe, e não tenho do que reclamar, os artistas que tive contato até hoje me receberam muito bem, fortalecendo o meu corre, me abrindo portas, realmente me mostrando que pode demorar, mas o trabalho feito fora do mainstream consegue sim conquistar o seu espaço. Não vou romantizar, é difícil, é mais lento, precisava ser mais visto, mas é o que temos agora e se a gente parar de fazer não vamos mudar essa realidade.

K: E como é característico da cena underground, que trabalha de forma mais colaborativa, em Uberlândia você conta com a coletividade do BRONX, selo fonográfico que fortalece as criações artísticas da sua cidade e tem acompanhado os seus lançamentos até aqui. Na sua visão, o quão importante o selo tem sido para o lançamento dos seus trabalhos e para a elevação da cena artística de Uberlândia?

B: Um salve pra minha família BRONX! Bom, hoje a BRONX me cede o espaço para criação com alguns equipamentos que realmente ainda não tenho condições de comprar (sabemos o quanto é caro), o que já me adianta muito, e conto sempre com outro produtor pra finalizar a mixagem e a masterização. Arte é esse conjunto pra mim, onde cada um contribui com o seu melhor. A BRONX hoje em Uberlândia é um coletivo que tá sempre disposto a trabalhar com outros artistas, independente do selo e vejo que isso formou muito do meu caráter como artista e querer sempre somar de alguma forma.

Grandes encontros e novos projetos

K: Ao mesmo tempo em que sua identidade se firma cada vez mais no underground, alguns contatos diretos com artistas mais clássicos e grandes referências do Rap nacional estão acontecendo, levando as suas produções para trabalhos com grandes nomes como DJ Hum e Arnaldo Tifu. Entre a aceitação em um nicho mais tradicional, como o Boom Bap, e a oportunidade de desbravar a arte ao lado de referências, como você sente esse alcance da sua atuação como beatmaker?

B: Salve DJ Hum e Arnaldo Tifu, são grandes referências pra mim! Sendo sincera é uma coisa nova pra mim, achava muito utópico produzir com pessoas que são referências no Boom Bap, mas isso mostra que o Boom Bap vive e para além disso, tem se reinventado e acolhido novos artistas que querem manter o movimento vivo, e tem me aberto portas que sou muito grata, tem feito minha arte chegar em lugares que eu sendo do interior de Minas Gerais não acreditava muito que pudesse chegar, e mostrar que mesmo sendo nova e produzindo há pouco tempo, levo o meu trabalho com seriedade e acho que isso que deve ser levado em consideração em qualquer estilo, seja ele Drill, Funk, Trap, Boom Bap.

K: Pra fechar esse nosso papo, eu queria saber mais sobre o que está vindo aí nos seus trabalhos. Sei que tem ainda o lançamento da Endorphins Lab, na série dos sentidos e o seu aguardadíssimo álbum “Loops Undergrounds”. O que você pode adiantar pra gente dos próximos trabalhos e projetos da B No Beat?

B: Esse ano também saí no álbum do Coronel, assinei uma produção no disco dele, um artista do underground que tem uma estética que gosto muito e finalizo o meu ano com o sexto sentido no projeto da Endorphins que foi um desafio maravilhoso, fazer um beat pensando em um sentido, o que pra mim tem muito haver comigo e até com a questão do beat falar. Fiquei muito grata pelo convite.

2022 já chega com “Loops Undergrounds” que é um projeto que tenho me dedicado desde meados de agosto de 2021,vai ser minha primeira mix tape com voz, e trouxe artistas que realmente fortalecem minha arte e conhecem minha trajetória até aqui, me senti representada em cada rima. Fora isso tenho já algumas produções para lançar que ficaram para o início do próximo ano mas nada que me permita falar ainda haha, esperem muito Boom Bap, isso eu posso garantir.

B No Beat / Foto: @red.wl

Todos os nossos agradecimentos à B No Beat por essa troca de ideia! Acompanhem a B e todas as suas produções e lançamentos nas redes sociais e plataformas digitais: Instagram, Spotify, SoundCloud, Deezer, Apple Music.

Leia Mais
nova geração
A nova geração precisa conhecer o Hip-Hop