Endorphins Lab e o amor pela cena beatmaker

Conversamos com Allb sobre o selo Endorphins Lab, e todo o corre feito pela valorização da cultura beatmaker

A música tem um poder único, de expressar sentimentos sem necessariamente alguém cantar ou dizer palavras. Muitas vezes o toque de um instrumento ou a forma como determinado som foi sampleado consegue definir o momento, o selo Endorphins Lab traz esse amor pela música em seu trabalho.

Pensando em não somente ouvir, mas sentir fisicamente, o selo resgata as raízes da música com as fitas cassetes mas não despreza a modernidade dos streamings, ao mesmo tempo em que valoriza também o conceito das capas, uma arte muita vezes esquecida por apreciadores da música, fazendo com que os ouvintes sintam a música por todos os sentidos, não apenas a audição.

O selo curitibano nasceu de todo esse misto de sentimentos pela música, pelo álbum completo, pelo cheiro de vinis e fitas empoeiradas, indo na contramão do mercado atual, ouvindo e digerindo cada segundo de um disco. Conversamos com Allb, um dos fundadores da Endorphins Lab, um selo independente de beatmakers que conta com lançamentos constantes de mixtapes e beattapes. Aqui no Kalamidade já entrevistamos um dos grandes nomes do selo, a beatmaker Numa e o seu disco “Inferno Verde”.

O início do selo Endorphins Lab

Logo: Endorphins Lab

Kalamidade: Como e quando surgiu a ideia da criação do selo? Quem compõe o Endorphins Lab?

Allb: A ideia de criar o selo surgiu comigo, originalmente em 2013 e foi sendo lapidada por algum tempo até 2018. Então junto com o Pietro [Domiciano], começamos a desenvolver a marca e inserir conceitos administrativos para não ser mais um projeto supostamente interessante que morre rápido.

Quando digo isso, é porque pensamos na continuidade do projeto e buscamos tocá-lo de uma forma profissional, por sentirmos que essa é uma característica que falta em nosso ambiente. Para se ter uma análise relevante sobre isso, fomos estudar outros selos, gravadoras, artistas, cenas e iniciativas de todo tipo, relacionadas à cultura beatmaker. Então em Fevereiro de 2019, lançamos oficialmente o selo.

Naquele momento Endorphins era formado apenas pelo Pietro e eu, e foi um ano pesado, porque éramos apenas dois e tomamos muitas rasteiras no meio do caminho. Ainda no fim de 2019, a Numa e o Vinicius, tornaram-se parte do time para melhorar algumas deficiências que mapeamos e eles nos ajudaram e seguem ajudando a elevar o nível. Atualmente somos Pietro, Vinicius e eu, dependendo das demandas incorporamos outros artistas e profissionais pra trazer outras visões e melhorar nossos conceitos e projetos.

Temos muito zelo, com a qualidade do que lançamos. Não abrimos mão disso.

Escolhas para o Endorphins Lab

K: O Endorphins Lab tem um conceito visual e sonoro bem definido, tanto que o lema é “ouvimos local para produzir global”, como funciona a dinâmica do selo? Como são feitas as escolhas de artistas e trabalhos produzidos?

A: O que escolhemos primeiro são os conceitos. Martelamos muito nisso, porque é o que dá consistência e substância aos projetos. Música é arte e é um assunto sério, não pode ser algo vazio, que não transmite ideia alguma. Podemos ser um selo de música instrumental, mas também comunicamos ideias, o que aumenta muito a responsabilidade do que lançamos.

Depois de bem definido o conceito, mapeamos artistas que podem se encaixar nele. Quando digo encaixe é no sentido que o projeto vai dar prazer ao beatmaker e ao selo. Só assim existe conexão entre as duas partes, e dos dois com a arte como meio de expressão. Para isso ouvimos muita música de muita gente, coisas que nós pesquisamos, outras que nos enviam.

Aí que a frase “ouvimos local para produzir global”, entra. É uma metáfora justamente para expressar essa conexão. Queremos nos conectar com o maior número de artistas que conseguirmos, para então levar as músicas, ao maior número possível de apreciadores da cultura beatmaker.

Fita cassete e suas raízes

K: Por que e de onde veio a ideia de investir e produzir fitas cassete?

A: A fita é um ícone da cultura beatmaker. No início, essa era a única forma dos produtores apresentarem seus beats ao público e aos MCs que eles tinham intenção de trabalhar. Ou seja, a fita é também uma forma de respeitarmos a história dos nossos predecessores.

Hoje os recursos de produção e divulgação são abundantes, mas as fitas ainda expressam o que é ser um beatmaker, um curador musical, que transgride uma forma existente de arte, levando a outro contexto criativo. Pra quem está chegando agora, pode ser ainda desconhecido e portanto passível de negligencia, por isso fazemos lançamentos em fitas cassete. O começo e o meio, tem que ficar bem presente na memória, pra não deturpar o futuro da nossa cultura.

Coletânea de beats com samples brasileiros

K: O selo lançou uma coletânea com beats só com samples brasileiros, como foi elaborar esse trabalho envolvendo tanta gente e porque decidiram priorizar a música nacional junto com as batidas?

A: No momento que estudávamos este projeto, sentíamos que não estávamos cumprindo nosso papel de se conectar com a comunidade beatmaker. Por isso, julgamos que a coletânea seria a melhor forma de se ligar aos artistas, dando livre acesso ao selo, a quem quisesse participar. Já a ideia dos samples brasileiros, pensamos ser o tema mais óbvio para um selo daqui, porém teve algo que pesou para a definição dessa tema.

Muitos ouvintes as vezes dão mais atenção para os artistas internacionais que usam samples brasileiros em suas criações. Geralmente isso acaba naquele estilo meio que “música brasileira pra gringo ouvir”. A ideia era ter beats não óbvios usando samples de música brasileira, essa foi uma das premissas para seleção das faixas.

Deu bastante trabalho, porque recebemos muito material e confesso que tirar um artista da lista final dói um pouco, porque temos a visão que na arte não existe competição, mas quando trata-se de selecionar músicas, infelizmente acaba-se passando por isso. Fora este aspecto, a interação com os artistas foi muito boa. Mesmo à distancia, fizemos muitos amigues querides, e mantemos contato frequente com muitos. Com certeza esse foi nosso melhor projeto, por isso decidimos torná-lo anual.

Programa Mixtape

K: Fale um pouco do projeto do programa mixtape, quem faz parte e qual o objetivo dele?

A: O programa Mixtape é o nosso podcast, produzido por mim [Allb] e voltado ao pesquisador musical, DJs, seletores, beatmakers, produtores, músicos ou simplesmente aos ouvidos atentos e adictos em música. O mote principal do programa é o garimpo, justamente aquilo que é a base da cultura beatmaker, como uma forma de estímulo às pessoas a procurarem artistas diferentes do trivial.

Em vários programas apresentamos aquele lance de “Originais x Sampleadas”; Radar de Lançamentos; Misturando Música; e informação para os ouvintes. Todo programa é preparado e então gravado em fita cassete, assim como eram feitas as mixtapes antigamente, gravando músicas do rádio pra montar as coletâneas.

O podcast também é o primeiro de alguns projetos que vamos lançar em 2021, que não são necessariamente álbuns, EPs ou coletâneas. Estamos olhando para projetos não musicais, mas relacionados a música. Temos alguns em produção já.

Papo de futuro

Foto: Endorphins Lab

K: Quais os próximos projetos ou artistas que a Endorphins Lab vai trabalhar?

A: Queremos que o ano de 2021 seja de parcerias para a Endorphins Lab, com o intuito de fortalecer a comunidade artística, em torno da ideia de que o beatmaker é um artista de fato, ao contrário do conceito que muitos ainda tem.

Acabamos de lançar “A Beatmaker’s Tribute to Nirvana’s In Utero”, um álbum de remixes de faixas do Nirvana, em parceria com a Mezcla Viva Records, selo capitaneado pelo Lemoskine, justamente para reforçar que o beatmaker vai muito além do Rap.

Vai ter também a “Headnod Mixtape Volume 2”. Estamos quase fechando tema e em março iniciaremos a chamada pra envio dos beats.

No campo musical acho que teremos ainda mais dois ou três projetos que não podemos falar, hehehe. O podcast Mixtape continua em 2021, mas estamos preparando um outro formato para ele. Também queremos iniciar nossa jornada audiovisual, com alguns projetos do tipo.

Como disse antes, queremos mesmo é congregar as pessoas interessadas na cultura beatmaker, em torno dessa arte sensacional.

Acompanhem o corre e os lançamentos da Endorphins Lab pelas redes sociais, plataformas de streaming e pelo site oficial do selo.

Links: Site oficial; Spotify; YouTube; Instagram; Facebook.

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